Diz o ditado que mãe não é só a que coloca no ‘mundo’, mas sim quem ama e cuida do filho incondicionalmente. Em Várzea Grande, em Cuiabá MT, encontramos uma dessas histórias que aquecem nossos corações e deixam o dia bem mais alegre e cheio de esperança.
A enfermeira Solange Maria Pires, de 56 anos é mãe de Ronei Gustavo Pires, de 12 anos, o garoto nasceu com agenesia do corpo caloso, uma má-formação congênita na qual a criança não possui a estrutura que conecta os dois hemisférios cerebrais e tem também neuropatia crônica, possivelmente causada pela falha na formação do cérebro, que atinge o sistema nervoso e afeta o desenvolvimento de funções como a postura e os movimentos.
Mas essa história começa a 11 anos atrás quando o amor que ela sentiu por Ronei levou-a adotá-lo. A decisão mudou radicalmente a vida de ambos.
Abandono dos pais biológicos
Quem vê Ronei atento a cada movimentação da mãe Solange, não imagina como foi o início da vida deste garoto que apesar de não ter movimentos consegue se comunicar com a mãe através do olhar.
Desde que nasceu o menino tem um quadro gravíssimo de convulsões, que foi causado pela neuropatia. Um fato ocorrido piorou bastante a saúde já debilitada de Ronei, enquanto ele era amamentado, ele teve um episódio de broncoaspiração – quando alimentos ou líquidos são aspirados pelas vias aéreas.
A enfermeira explica que a família biológica demorou para buscar uma ajuda médica, isso fez com que o quadro que já não era favorável agravasse mais ainda a saúde do garoto. Com pouco mais de um ano, ele foi diagnosticado com paralisia cerebral e passou a viver em estado vegetativo.
O garoto nascido em Cuiabá então foi abandonado pelos pais biológicos que não suportaram os problemas de saúde de Ronei. Com um ano e morando em um lar para crianças e adolescentes foi assim que Solange conheceu Ronei.
Solange que é divorciada, não teve dúvidas e adotou o menino, ela que já tinha dois filhos de 33 e 37 anos, porém já não viviam mais com a mãe, agora tinha um novo desafio que era cuidar do caçula que precisaria de atenção 24 horas.
“Eu sinto o mesmo amor pelos meus três filhos. Mas sei que me dedico mais ao Ronei do que me dediquei aos outros dois, porque eles sempre foram saudáveis, se desenvolveram normalmente e foram saindo das minhas asas. Já o Ronei, sei que vai estar sempre aqui e sempre vai precisar dos meus cuidados”, diz Solange à BBC News Brasil.
A decisão
Solange nunca teve dúvidas sobre a adoção de Ronei, porém a família e conhecidos ficaram espantados com a decisão da enfermeira em adotar uma criança que vive em estado vegetativo. “Algumas pessoas me desaconselharam, me disseram para viver uma fase mais tranquila, pois meus filhos já estavam criados. Mas eu não tive dúvidas de que deveria cuidar do Ronei. Ele é meu filho, assim como os outros dois que eu pari”, declara.
Mas a decisão de adotar o garoto começou em 2008, quando Solange trabalhava em uma empresa que prestava serviço de home care, foi buscar Ronei, após uma decisão judicial que permitia que ele tivesse o direito à internação domiciliar.
“Fui atrás dele na casa dos pais biológicos e da avó, mas ele não estava. Me disseram que ele estava no Lar da Criança. Depois, descobri que ele estava internado no Pronto-Socorro de Cuiabá”, diz.
Ela conta que os pais biológicos, haviam visitado Ronei poucas vezes no hospital, foi quando após receber alta médica a justiça determinou que o Estado pagasse uma casa para a família biológica morar com ele, pois a residência onde moravam era totalmente precária e não teria condições de receber a home care. “A expectativa era de que os familiares se reaproximassem do Ronei e ajudassem o tratamento dele, caso fossem para um novo lar”, conta a enfermeira.
Guarda do menino
Porém não foi isso que ocorreu, após nova piora de Ronei, a família se distanciou cada vez mais do menino, afirmando não ter condições psicológicas e nem financeiras, para ficar com o ele. “Eles abriram mão do filho, disseram que eu poderia criá-lo”, conta.
Após uma audiência, a Juíza explicou a Solange que ela não era obrigada a continuar com o garoto, caso não quisesse. Se a enfermeira não o criasse, ele seria levado a um lar para crianças aptas à adoção. “Não tive dúvidas, disse que o Ronei era meu filho e que ficaria com ele”, diz Solange.
“A juíza me perguntou duas vezes, porque queria que eu tivesse certeza da responsabilidade que teria pela frente. Novamente, disse que era aquilo que eu queria. Não iria abrir mão do meu filho”, relata a enfermeira, que recebeu apoio dos dois filhos.
“Eu sou a mãe dele”
Praticamente a vida de Ronei se resume à cama do quarto, mas durante todo o dia ele receber ajudada profissional. A cada 12 horas tem um novo técnico de enfermagem que acompanha o garoto, já incluso o serviço de home care.
Solange trabalha em um hospital no período da manhã e, por meio do celular, fica atenta a tudo o que acontece com o filho. “O tempo todo pergunto como ele está ou peço para mandarem fotos. É uma preocupação constante”, diz.
Mas quando não está trabalhando, a dedicação ao filho é constante, ela tenta se distanciar o mínimo possível. “Se eu saio, tento voltar rápido. Nas vezes em que viajei, tive que comprar passagens perto da data, porque se ele não estiver bem, não viajo. E não posso ficar dias longe”, comenta.
Mas o que mais entristece Solange é o fato de Ronei estar ficando mais debilitado com o passar dos anos. “Ele está regredindo e atrofiando. As mãos e os pés dele tinham mais força antes, mas agora está mais fraco. Infelizmente, não há muito o que ser feito no caso dele”, lamenta a mãe.
A falta de esperanças em um futuro melhor deixa Solange muito triste, porém apesar disso a enfermeira diz nunca ter se arrependido de sua decisão de adotá-lo. “Parei muita coisa por ele. Mas é normal uma mãe fazer isso por um filho.” diz Solange.
“Uma médica me disse que ele viveria somente até os oito anos, mas ele está aqui comigo até hoje. Acho que o que mantém vivo é o amor que ele recebe”, diz.
O principal desejo de Solange para o futuro do filho caçula é que ele tenha qualidade de vida. “Peço a Deus que se for para levar o Ronei, que não seja nada doloroso. Não quero que ele sofra em um hospital.”
Com informações:G1