Por Juliana Conte
Enxaqueca é um problema sério que acomete 15% da população brasileira, segundo a Sociedade Brasileira de Cefaleia. Quem pensa que enxaqueca é uma simples dor de cabeça que passa com um analgésico comum, está enganado.
Por conta de um desequilíbrio químico que se origina no sistema nervoso central, as crises podem durar de 4 a 72 horas. E para se livrar da dor os pacientes tomam remédios que, infelizmente, demoram a fazer efeito e tornam a dor crônica.
Qual seria o caminho, então, para amenizar o problema? Segundo a dra. Célia Roesler, vice-coordenadora do Depto. Científico de Cefaleia da Academia Brasileira de Neurologia, é importante que o paciente procure um neurologista especializado em cefaleias (Hospitais Universitários são uma boa opção) e que cobre do profissional planos terapêuticos efetivos.
Veja na entrevista a seguir como funciona o tratamento preventivo da enxaqueca e como ele pode ajudar a diminuir as crises:
1. Como funciona o tratamento preventivo da enxaqueca? Quais medicamentos são utilizados?
Quando um paciente toma analgésico duas ou mais vezes por semana para controlar as dores de cabeça, já está na hora de iniciar um tratamento preventivo. O tratamento se faz com um ou mais medicamentos de uso diário, que podem ser da classe dos antidepressivos, ou então medicamentos que também são utilizados para epilepsia, porém, com doses inferiores às usadas para essas patologias. Esses medicamentos agem reequilibrando a função de alguns neurotransmissores e em substâncias químicas no cérebro, tornando a pessoa menos suscetível às crises.
A escolha, na verdade, é feita de acordo com o perfil do paciente. Por exemplo, se ele for hipertenso, escolhemos um medicamento que ajude também a controlar a pressão arterial. Se tiver tendência à depressão, optamos por antidepressivos, e assim por diante.
2. Por qual motivo se utiliza medicamentos para depressão e epilepsia?
Os antidepressivos são utilizados porque eles inibem a recaptação de uma substância chamada serotonina. Então, como a enxaqueca também ocorre por conta dos baixos níveis de serotonina no organismo, principalmente durante as crises, esses medicamentos ajudam a aumentar a serotonina circulante, o que auxilia no tratamento e na diminuição das crises de enxaqueca.
Em relação às drogas utilizadas para a epilepsia, como o topiramato, por exemplo, as disfunções cerebrais que ocorrem na enxaqueca são bem parecidas às da epilepsia. Por isso esses remédios funcionam bem para quem tem crises com aura (crises de enxaqueca acompanhadas por alterações visuais ou sensitivas), pois eles agem nos receptores cerebrais chamados gaba que atuam justamente no centro da dor. Mas reforço aqui que esse tipo de tratamento necessita de acompanhamento médico, porque serve para casos específicos e é feito com base no perfil de cada paciente. Sempre procure um especialista em cefaleias.
3. As crises realmente diminuem com o tratamento?
O tratamento começa a ter respostas efetivas a partir do segundo, terceiro mês. Mas é de extrema importância que o paciente também mantenha hábitos de vida mais saudáveis, como fazer atividade física regularmente, prestar atenção nos alimentos que consome e que podem funcionar como gatilho para as dores, entre outros. Assim que iniciamos o tratamento, pedimos que o paciente faça um diário da dor, apontando quando as crises ocorrem, o que as pode ter causado, sua duração etc. Isso ajuda bastante no manejo do tratamento.
4. Quais são os efeitos colaterais mais comuns?
Infelizmente, alguns medicamentos podem causar sonolência, ganho de peso ou perda de apetite. Por isso, sempre iniciamos com uma dose muito baixa e vamos aumentando de acordo com a tolerância do indivíduo. É importante que o paciente sempre informe o médico sobre efeitos adversos e nunca interrompa o tratamento de maneira abrupta.
5. E para os pacientes refratários ao tratamento? Quais são as opções?
Alguns pacientes são refratários aos tratamentos habituais que citamos acima. Quando isso ocorre, revemos todo histórico do paciente, hábitos de vida, indicamos terapia cognitiva comportamental (TCC), técnicas de relaxamento e acupuntura, que tem se mostrado um tratamento alternativo muito eficiente.
Para aqueles que têm mais de 15 dias de dores de cabeça num único mês (portadores de enxaqueca crônica), temos a opção de aplicação a cada três meses de toxina botulínica, que proporciona relaxamento dos músculos da cabeça e reduz a frequência dos episódios de enxaqueca.
6. Por que é tão difícil tratar a enxaqueca?
Porque é uma doença multifatorial. Além do fator genético, o consumo de determinados alimentos, sono prolongado ou insuficiente, excesso de exposição ao sol, alterações hormonais, odores fortes e a ingestão de bebida alcoólica podem estar associados e desencadear uma crise. Transtornos de humor, como ansiedade e depressão, também podem estar relacionados a um episódio de enxaqueca.
Como se vê, muitas vezes é difícil identificar a causa exata da crise. Isso faz com que alguns indivíduos comecem a fazer uso abusivo de medicação. Esse tipo de paciente é bem complicado de tratar, pois ele em geral não consegue esperar a resposta do tratamento preventivo e dificilmente cumpre as recomendações do médico que o acompanha.
Por isso a mensagem principal que gostaria de deixar é que não é normal sentir muita dor de cabeça. Há pacientes que têm mais de 20 episódios num único mês. É possível prevenir e diminuir a frequência dessas crises.
Informações: Drauzio Varella