Guy Mettan é deputado em Genebra, na Suíça, porém não tem carro oficial.
Quando não está de ônibus do transporte público ele chega à sede do poder legislativo pilotando a sua moto, que não conta com nenhuma vaga reservada no estacionamento.
Será que ele ainda é novato, será que não pegou as “manhas” do mundinho do “poder”? Não. Ele é deputado há 18 anos consecutivos.
O Deputado Guy também não tem auxílio-moradia, auxílio-refeição que até existe, mas que dá direito a duas refeições por mês. Não é por dia: é por mês. Cada vale permite consumir, em média, uma pizza e uma taça de vinho.
Outro detalhe é que enquanto for deputado, ele não pode contratar nenhum parente. E após o final do mandato, que dura quatro anos caso não seja reeleito, ele não adquire nenhum direito a receber aposentadoria pelo cargo de deputado, mesmo após os seus 18 anos de mandato.
O salário é calculado de modo muito simples: por hora de trabalho na câmara. Ele mesmo explica:
“Se você vem, você recebe. Se não, não recebe”.
Mas como saber se realmente o deputado foi ou não ao trabalho? Simples:cada deputado precisa assinar, de próprio punho, uma lista de presença em cada sessão.
O salário anual de um deputado é equivalente aos rendimentos médios de um ajudante de cozinha. Quem ganha um pouco mais é o presidente da câmara, que, mesmo assim, recebe um salário menor que os rendimentos de um profissional produtivo como um mecânico, ou uma secretária, ou um policial, ou uma professora de jardim de infância, ou um metalúrgico, ou um caminhoneiro.
Por isso mesmo é que os deputados dessa câmara mantêm os seus empregos normais, inclusive durante o exercício do mandato.
A política é entendida por eles (e pelos seus eleitores) como um “envolvimento popular”, um serviço cidadão: não é uma carreira; não é uma profissão. Os rendimentos de um deputado são apenas uma justa indenização pelo tempo que ele cede ao serviço da população.
É por isso, aliás, que as sessões acontecem sempre no final da tarde, quando cada deputado já terminou o expediente no seu emprego normal. É por isso, também, que ele atesta:
“Aqui não existe deputado profissional”.
Trata-se de uma das regiões mais ricas não só do país, mas do mundo inteiro. Genebra aparece todo santo ano em qualquer lista das cidades mais caras do mundo.
O presidente do parlamento recebe cerca de 50 mil francos suícos por ano, ou seja R$ 175 mil, por ano. Um deputado normal receberá 30 mil francos, ou o equivalente a R$ 105 mil por ano.
Comparando com o Brasil um deputado estadual, ganha cerca de R$ 25.300 por mês no Estado de São Paulo, por exemplo, o que resulta em R$ 328.900 por ano, contando o décimo terceiro salário (e sem contar décimo quarto, quinto e sabe Deus quantos mais eles se concederem). Fora as ajudas de custo que não iremos nem mencionar!
O salário mínimo de um cidadão comum no Brasil é de R$ 954 por mês, ou R$ 12.402 por ano, somando o décimo terceiro (para os que o recebem).
A diferença é que na Suiça não existe salário mínimo, pois ninguém ganha tão pouco a ponto de precisar que o governo estabeleça um piso.
Mas só para compararmos, quem ganha menos no país recebe cerca de 42.000 francos por ano, o equivalente R$ 147.000 em Reais.
São em torno de 3.500 francos por mês, ou R$ 12.250. Um suíço pobre, nominalmente, precisa de um mês para ganhar o que um brasileiro assalariado com o mínimo demora 13 meses para receber.
É claro que as comparações de valores entre francos suíços e reais são extremamente inapropriadas e distorcidas, pois o custo de vida na Suíça é tão alto que um salário nominalmente equivalente a R$ 12.000 mal daria para viver com segurança.
Ainda assim, há uma comparação perfeitamente correta que pode e deve ser feita: o equivalente a um deputado “estadual” suíço ganha menos que um trabalhador pobre no seu país – e ele próprio considera que este valor é perfeitamente justo para o trabalho extra que um deputado presta à sociedade após o seu expediente como cidadão comum.
Estas informações são de março de 2018 e procedem desta matéria do Estadão. O correspondente responsável pelo texto, Jamil Chade, foi até Genebra para conversar com Guy Mettan.
A Suíça está muito longe de ser um país perfeito: lá também há corruptos, lá também há pessoas que enfrentam o drama do vício em drogas, a dor da depressão, a angústia diante da morte, o choque diante de agressões, abandonos, suicídios, homicídios (em muitíssimo menor escala, como quer que seja). Lá também acontecem fracassos comerciais, escolares, familiares.
Lá também ocorrem falhas em empresas, em órgãos públicos, na justiça. Existem suíços que são ateus, católicos, budistas, muçulmanos, protestantes, esotéricos, agnósticos, indiferentes.
Existem suíços que mentem, exploram, adulteram. É um país, em suma, formado por seres humanos tanto quanto Portugal, Angola, Moçambique, Brasil, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe…
Porém é um país em que parece existir uma cultura de trabalho focado em excelência mensurável, não retórica.
Informações: Aleteia
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